Tonto de tanto dormir ou de tanto pensar,
Ou de ambas as coisas.
O que sei é que estou tonto
E não sei bem se me devo levantar da cadeira
Ou como me levantar dela.
Fiquemos nisto: estou tonto.
Afinal
Que vida fiz eu da vida?
Nada.
Tudo interstícios,
Tudo aproximações,
Tudo função do irregular e do absurdo,
Tudo nada.
É por isso que estou tonto ...
Agora
Todas as manhãs me levanto
Tonto ...
Sim, verdadeiramente tonto...
Sem saber em mim e meu nome,
Sem saber onde estou,
Sem saber o que fui,
Sem saber nada.
Mas se isto é assim, é assim.
Deixo-me estar na cadeira,
Estou tonto.
Bem, estou tonto.
Fico sentado
E tonto,
Sim, tonto,
Tonto... Tonto." [Álvaro de Campos*]
Sinto-me assim: tonto!
Consequência do que se quebrou.
Permiti.
Consequência do que se quebrou.
Permiti.
*Álvaro de Campos é dos mais um dos heterônimos mais conhecidos do poeta português Fernando Pessoa. Este fez uma biografia para cada um dos seus heterônimos e declarou assim que Álvaro de Campos: «Nasceu em Tavira, teve uma educação vulgar de Liceu; depois foi mandado para a Germânia estudar engenharia, primeiro enfermaria e depois naval. Numas férias fez a viagem ao Oriente de onde resultou o Opiário. Agora está aqui em Lisboa em inatividade.»
Era um engenheiro de educação inglesa e origem portuguesa, mas sempre com a sensação de ser um estrangeiro em qualquer parte do mundo. Pessoa disse também em relação a este heterónimo que :
"Eu fingi que estudei engenharia. Vivi na Escócia. Visitei a Irlanda. Meu coração é uma avozinha que anda Pedindo esmolas às portas da alegria." "Que náusea de vida ! Que abjecção esta regularidade ! Que sono este ser assim !" Via: Wikipedia e Revista Agulha |
2 comentários:
Fernando Pessoa (e seus muitos "eus")é uma delícia de se ler, e ao mesmo tempo é perturbador. Esse eu não conhecia!
Para mim o melhor dele é aquele famosinho: "O poeta é um fingidor, finge tão completamente que chega a fingir que é dor, a dor que deverás sente."
A melhor descrição do poeta e sua alma que eu conheço!
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